Sobre despedidas

Ano passado aprendemos muito sobre despedidas. Possivelmente nós tivemos muitas “últimas vezes” em 2020. A última vez que viajamos livremente. A última vez que nos reunimos com quem amamos sem temer. A última vez que trabalhamos presencialmente e tivemos aquela resenha na hora do cafezinho. A última vez que nosso filho foi para escola e chegou contando histórias dos amiguinhos e professores. A última vez que fizemos planos a curto prazo, para daqui a uma semana, um mês. A última vez que pudemos abraçar alguém querido e pode ter sido para sempre…

Acredito que essa última foi a despedida mais dura e em maior número para muitos… tivemos que aprender a nos despedir de amigos, colegas de trabalho, primos, irmãos, pais, tias, amigos de amigos, pais de amigos, avós de amigos. A despedida nunca nos assustou tanto.

Em 2020 perdi um tio muito querido e, ontem, minha tia, esposa dele e irmã do meu pai. Eles não foram vítima da Covid, mas a perda coincidiu com a pandemia, o que me fez deixar de vê-los no último ano. Mesmo sabendo que eles não estavam bem, eu não pude visitá-los por medo de contaminá-los. Assim, nos despedimos muito antes da partida deles ocorrer. Um casal que jamais esquecerei pela doçura e o calor com que sempre me receberam e me abraçaram. Me despedir deles fez minha mente pensar nessas despedidas. E doeu.

Ontem, enquanto pedalava, ouvia uma música que, na primeira vez que ouvi, não me encheu de significado como ontem. É uma musiquinha chiclete do Marcelo Jeneci, se você ouvir, vai cantarolar (certeza!), se chama “Dar-te-ei”. Eis um trecho:

Não te darei flores, não te darei
Elas murcham, elas morrem
Não te darei presentes, não te darei
Pois envelhecem e se desbotam (…)
Dar-te-ei a mim mesmo agora

E ouvindo essa música, a frase “dar-te-ei a mim mesmo agora” fez todo sentido naquele momento. De fato, o melhor que podemos dar aos que estão conosco é nós mesmos no momento presente. É o que ficará. Um dia eu “me dei” ao meu tio, para esse momento presente com ele eu levei um bolo quentinho de banana e um café especial que preparei. Para minha tia, na última vez que nos vimos, eu “me dei”, em um dia cheio de compromissos do trabalho, para o momento presente com ela, tirei um tempo e comprei uns biscoitinhos de castanha que ela queria levar para presentear o seu médico e havia me ligado, no dia anterior, perguntando onde poderia comprar. E quando eu recebi a notícia de que estavámos nos despedindo para sempre, eu não lembrei de mais nada, além desses dois momentos com cada um deles. Apesar de sempre achar que poderia ter estado mais presente, meu peito se encheu de alegria por isso.

Despedidas sempre vêm acompanhadas de nostalgia pelo que foi e pelo que não será novamente. No entanto, em cada uma delas percebemos que o melhor da vida foi ter estado lá nos dando ali mesmo no agora. Despedidas só ocorrem porque vivemos algo e do valor que essa experiência ou pessoa deixou em nós nunca precisaremos nos despedir!