Do livro Cartas a um Jovem Poeta
(Rainer Maria Rilke)
Uma citação especial pela passagem do Dia da Mulher (08/03/2021). Essa carta foi escrita em 14 de maio de 1904… e ainda é tão atual! Até quando alguns avançarão sobre as margens alheias?
“Tanto a menina quanto a mulher, em seu novo desdobramento, em seu florescimento individual, já não serão por muito mais tempo imitadoras dos erros e acertos do homem, tampouco deverão repetir o que eles realizam profissionalmente. Após o período de incerteza de tais transições, nos parecerá óbvio que as mulheres vestiram tais disfarces variados e abundantes (por vezes ridículos) apenas para que tivessem tempo de purificarem suas naturezas femininas das influências viciadas e deformadas do gênero oposto.
As mulheres, onde a vida reside de forma mais imediata, oculta e cheia de frutos, certamente logo se tornarão mais maduras e humanas em seu íntimo do que os homens frívolos e superficiais, que ainda não foram arrastados para as profundezas da vida pelo peso das relações carnais e, de forma arrogante e apressada, subestimam e menosprezam o que eles imaginam amar. Esta humanidade das mulheres, carregada em seus ventres ao longo de todo o seu sofrimento e humilhação, virá à luz quando elas se despirem das convenções do feminino que surgem das transformações do seu próprio status social. E aqueles homens que ainda sequer perceberam o que já está tão próximo de nosso tempo, em breve ficarão atônitos. Nalgum dia (e até mesmo hoje, especialmente nos países do norte europeu, onde sinais confiáveis já brilham ao sol) existirão meninas e mulheres cujos nomes não mais carregarão significados meramente opostos ao que é masculino, mas antes algo em si mesmo, algo que não nos levará a imaginar quaisquer complementos ou limites, mas somente o que é vivo e real: o ser humano feminino. Tal avanço (inicialmente contra a vontade dos homens ultrapassados) transformará radicalmente a experiência amorosa, hoje tão preenchida de erro. Ele a refundará do chão, a remodelará numa relação feita para ser vivida, de fato, entre um ser humano e outro ser humano, não mais algo que simplesmente escorre do macho para a fêmea. E tal amor, mais humano (que se encherá de gentileza infinita, de carinho e clareza nos enlaces e desenlaces), se parecerá com o que hoje estamos preparando com grande dor e esforço: um amor onde duas solidões se protegem e se entrelaçam e se cumprimentam dia após dia, sem jamais avançarem sobre as margens alheias.”
Do livro Segunda Consideração Intempestiva: Da Utilidade e Desvantagem da História para a Vida (Nietzsche)
“Sobre a felicidade e a arte de esquecer, um dos meus textos preferidos! “A mais ínfima felicidade, quando está sempre presente e nos torna felizes, é incomparavelmente superior à maior de todas, que só se produz de maneira episódica, como uma espécie de capricho, como uma inspiração insensata, em meio a uma vida que é dor, avidez e privação. Tanto na menor como na maior felicidade, porém, há sempre algo que faz que a felicidade seja uma felicidade: a faculdade de esquecer, ou melhor, em palavras mais eruditas, a faculdade de sentir as coisas, durante todo o tempo que dura a felicidade, fora de qualquer perspectiva histórica. Aquele que não sabe instalar-se no limiar do instante, esquecendo todo o passado, aquele que não sabe, como uma deusa da vitória, colocar-se de pé uma vez sequer, sem medo e sem vertigem, este não saberá jamais o que é a felicidade, e o que é ainda pior: ele jamais estará em condições de tornar os outros felizes. É possível viver, e mesmo viver feliz, quase sem lembrança, como o demonstra o animal; mas é absolutamente impossível ser feliz sem esquecimento.”
Do livro Outro Jeitos de Usar a Boca
(Rupi Kaur)
“Quero pedir desculpas a todas as mulheres que descrevi como bonitas
Antes de dizer resilientes ou corajosas
Fico triste por ter falado como se algo, tão simples, que nasceu com você, fosse seu maior orgulho
Quando seu espírito já despedaçou montanhas
De agora em diante vou dizer coisas como: você é forte ou você é incrível
Não porque eu não te ache bonita, mas porque você é muito mais que isso.”
Do livro Sobre a Brevidade da Vida
(Sêneca)
“Cada um se lança à vida, sofrendo da ânsia do futuro e do tédio do presente. Mas aquele que utiliza todo o tempo apenas consigo mesmo, que organiza todos os dias como se fosse o último, não deseja, nem teme o amanhã. Que novo prazer existe que qualquer hora já não possa lhe trazer? Conhece todas as coisas, tudo foi desfrutado à saciedade. Do que falta, que o destino disponha como quiser: a vida já está assegurada. Nada lhe pode ser adicionado ou retirado e, mesmo que se acrescente alguma coisa, seria como alimentar o que já está farto de qualquer alimento, ou seja, receber o que não mais deseja. Não julgues que alguém viveu muito por causa de suas rugas e cabelos brancos: ele não viveu muito, apenas existiu por muito tempo.
Do livro Cartas a um Jovem Poeta
(Rainer Maria Rilke)
“Você é tão jovem, ainda tão distante das iniciações da vida! Eu gostaria de lhe pedir encarecidamente, caro Senhor, tanto quanto me é permitido, que tenha paciência com tudo isso ainda não resolvido em seu coração, e que busque amar as suas próprias dúvidas, como se elas fossem salas secretas, ou livros escritos em línguas desconhecidas. Não procure pelas respostas definitivas, respostas que não lhe poderiam ser dadas, pois você seria incapaz de viver com elas. E, portanto, é este o ponto: viver tudo, viver através de tudo. Viver suas dúvidas, agora mesmo. Então quem sabe, nalgum dia num futuro distante, sem que possa notar, você acabe trilhando naturalmente o caminho para algumas respostas.”